CAPITULO VIII
CONFISSÕES E COMUNHÕES DOS ESCRUPULOSOS
Sob este título, não queremos falar das dificuldades, das penas, dos temores que eles experimentam nas suas confissões e comunhões; já falamos disto mais acima, e ainda falaremos noutro lugar. Aqui se trata das confissões e das comunhões mais ou menos frequentes a permitir ou a prescrever aos escrupulosos. Deve-se fazê-los comungar amiúde? deve-se fazê-los confessar-se frequentemente?
Não se pode repetir demasiado, primeiramente que as práticas de piedade devem sempre harmonizar-se com as obrigações de cada um, com a posição, a idade, o engenho, a cultura de espírito que lhe é própria; de tal sorte que a frequência dos sacramentos ou os exercícios espirituais não impeçam o penitente de cumprir os deveres do seu estado, de fazer as suas práticas de piedade de maneira conveniente, e sirvam ao seu progresso e à sua consolação segundo as diversas necessidades de sua alma. Cumpre, também, em regulando o presente, pensar no futuro, e não fazer abraçar coisas de mais, a fim de poder o penitente perseverar.
A frequência da confissão depende necessariamente das circunstâncias individuais. Em geral, as pessoas que comungam de oito em oito dias, ou mesmo várias vezes na semana, habitualmente se confessam de oito em oito dias; há outras, entretanto, que, ou por vivacidade natural, ou por violência das paixões, ou por obstáculos mais numerosos, ou por dificuldades de conservarem a pureza de coração, precisam confessar-se mais vezes. Não obstante, é para desejar que elas se acostumem, pouco a pouco, a caminhar sozinhas, e a ser bastante firmes para só se confessarem uma vez na semana. Os verdadeiros escrupulosos, os que são incessantemente roídos pela apreensão, ora devem ser admitidos a uma confissão mais frequente, ora não devem sê-lo. Ao confessor é que compete julgá-lo. Deve este considerar as faltas que eles acusam ordinariamente. Se são verdadeiros pecados veniais caracterizados, ele deve ouvi-los; se são faltas que não são formalmente pecados veniais, se são censuras vagas, inquietações, não deve ele ouvi-las senão uma vez por semana, no máximo, ainda mesmo quando eles comungassem várias vezes na semana. Geralmente, há muitos inconvenientes em que um escrupuloso insista muitas vezes sobre essas espécies de faltas ou de pretensas faltas.
Quanto às comunhões, é preciso primeiro seguir as regras de São Francisco de Sales no tocante à comunhão frequente. Isenção de pecado mortal, ausência de afeto ao pecado venial, grande e ardente desejo para a comunhão de oito dias. Para a comunhão de cada dia, ou de vários dias na semana, é preciso, além disso, haver vencido a maioria das más inclinações do coração. Eis aí de acordo com que regras é preciso comportar-se. Mas, quanto às repugnâncias dos escrupulosos de boa fé, quanto àqueles que o demônio quereria afastar desse foco sagrado de fervor, de força e de vida, não se deve escutá-los. A resistência deles para se aproximarem muitas vezes não deve levar o confessor à condescender com o seu desejo. Pelo contrário, eles têm mais necessidade que qualquer outro desse maná celeste para lhes sustentar o ânimo, para lhes despertar a piedade e lhes consolar o coração. Sem esse divino alimento, eles definhariam, cairiam em desfalecimento, e sucumbiriam inteiramente.
É preciso tranquilizá-los, acalmá-los, e, não raro, forçá-los a aproximar-se da divina Eucaristia; porquanto são precisamente esses esmorecidos, esses fracos, esses doentes que o Pai de família quer fazer entrar como que à força na sala do seu festim; e o que prova que a comunhão é um dos melhores remédios contra os escrúpulos é que, ordinariamente, os escrupulosos nunca ficam mais tranquilos do que no dia em que comungam. Mister se faz, pois, resguardar-se bem de lhes secundar a repugnância, e de escutar os pretextos que eles aduzem para se absterem da comunhão: quanto mais o espírito deles for distraído e volúvel, tanto mais necessário é dar-lhe esse freio; quanto mais árido for o coração deles, tanto mais necessidade tem de ser regado por essa graça divina. Eles não deixarão de alegar, e é este o fantasma que mais os espanta, o pouco fruto que tiram da comunhão. Mas pode-se-lhes opor a resposta de São João Crisóstomo: “Não será porque as vossas comunhões ainda são muito raras?” Aliás, quem é que não sabe que os efeitos da comunhão nem sempre são, ou só são mesmo bem raramente, sensíveis? Os sentimentos que se produzem na alma nem sempre se assinalam exteriormente por impressões sobre os sentidos. Deus assim o permite para nos reter na humildade e na aplicação. Pode-se, pois, tirar grande proveito da comunhão sem o perceber, sem o sentir. Finalmente, pode-se-lhes dizer que a humildade que leva a pessoa a se crer indigna desse augusto sacramento não é um dos menores efeitos da comunhão. Pode-se, pois, ordenar-lhes participarem com frequência do festim eucarístico.
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