sábado, 1 de outubro de 2016

BELEZA DE MARIA, Quae est ista?


Que espetáculo não deverá ser no céu para os anjos, à vista desta criatura "cheia de graça" e aumentando ainda todos os dias esta plenitude inicial!...

No seio de Seu êxtase eterno, deviam eles interromper um instante os seus concertos, e inclinar-se para a terra, exclamando, alegres: "Quae est ista?"

Até então, toda criatura humana que entrava na existência era percebida pelos anjos como tendo a mancha original. Desta vez, porém, a criança que dorme neste berço parece subir do deserto; é única e isolada, e com respeito desviaram-se a carne e o sangue. A pequenina Imaculada é bem um deserto sobre o qual está o Infinito. Este berço apresenta aos anjos purezas, belezas e superioridades tais, que eles aspiram tê-lA como Rainha.(L.Lemann)

"Quem é esta que se adianta como a aurora a despontar?" (Cant 6,9).

Desde o despertar do Seu espírito e de Seu coração, Maria põe em prática, sem que disso duvide a sua candura, a significação da palavra "alma", pela qual Isaías anunciou ao mundo "uma virgem oculta, retirada, subtraída a todos os olhares".

Com a idade de três anos, se devemos crer na tradição, os primeiros passos da imaculada criança conduzem-nA para o altar do Senhor. Ela possui todas as graças da infância, todas as delicadezas da pureza, toda a irradiação do amor.
Sua alma virginal ilumina o Seu pequeno corpo santificado, os anéis de Seus cabelos louros cingem-lhe a fronte, como que de uma auréola de modéstia, e o Seu límpido olhar faz nascer a virtude e conduz a Deus.

É uma como aparição vinda do Céu; é a Virgem criancinha!

Sua alma se abre radiosa diante de Deus. As Suas pequenas mãos se estendem para o Santo dos santos, os Seus olhos fitam, iluminados, a eternidade. E os anjos cantam deslumbrados: Quae est ista?, quem é aquela que se adianta tão pura, tão santa e tão imaculada?...

E a Virgem criancinha cresce em graça e em beleza diante de Deus e diante dos homens. E Ela, que já parecia saturada dos eflúvios da divina graça, nEla se sacia avidamente e se dilata, e aquela que Lhe foi abundantemente dada, ela ajunta o que pede, o que atrai e o que merece.

Para falar sem figuras, esta plenitude inicial de graças, com que o Céu a gratificou, enriqueceu-se de uma plenitude adquirida por Sua cooperação santa.

No templo, a tenra Virgem Se entrega às santas meditações, às leituras sagradas e aos exercícios piedosos. Ela Se dá à prece com uma avidez insaciável. Os seus pequenos braços não abandonam o trabalho, a obediência dirige os Seus passos, a humildade constitui a sua auréola, a pureza eleva-A ao ponto culminante do heroísmo, em enquanto doce e cândida, Ela faz a Deus o voto de virgindade, todas as virtudes vêm como que personificar-se nesta débil e doce criatura que Suas companheiras chamarão "a pequena Maria".

E, nas alturas, os anjos não contemplam simplesmente, mas admiram até. E à vista desta luz então mais aparente e mais viva, que brilha à sombra do santuário, eles cantam com maior alegria e maior júbilo: "Quae est esta? - quem é, pois, aquela que tem a beleza silenciosa e casta dos astros da noite? É Ela que era luz, ei-lA agora foco.

E a Virgem cresce sempre e Se torna cada vez mais "o que deve ser", transformando a graça, puro dom de Deus, em mérito, riqueza adquirida - Ela cresce.

A medida parece estar repleta, mas o coração da Virgem adolescente se dilata sempre, aumenta, sob a pressão das novas "plenitudes", que sucedem à plenitude inicial.

Por meio da fé, dos santos desejos, do amor e da prece, Ela voa até Deus, vai alcançá-lO, Ela O toca!...

E os anjos, comovidos, cantam, extasiados: "Quae est ista? - Oh! quem é aquela que Se aproxima assim de Deus, que tanto é amada por Ele, e que O ama com um amor tão intenso, tão divino?...

O mistério realizou-se aqui na terra, e Deus engrandeceu de tal modo o coração de Maria, que Ela chega ao ponto supremo de santidade, e Se coloca em contato com Deus.

Deus Se precipita em Maria, diz Mons. Bolo (H. Bolo: Cheia de graça), pela simples lei da afinidade que rege o mundo sobrenatural, como o mundo natural. Sendo Maria Santíssima uma simples criatura, não pode ser divinizada, no sentido próprio da palavra, mas Deus substituiu a distância que Ela não podia transpor: - Ele se encarna.

Maria Santíssima não Se torna Deus em Deus, mas o Verbo Se faz carne em Sua carne.
Que plenitude! Que incompreensível grandeza! Ser Mãe do Verbo de quem o Eterno é o Pai!...

Os anjos, que contemplam sempre, velam a face com as suas asas...
Quae est ista?... Quem, pois, é Ela?... Eleita por Deus, Maria brilha entre os eleitos como aquele que os ilumina, resplandesce como o sol!

Parará aí a Virgem?... Haverá uma altura mais elevada de graças do que aquela que causa vertigem aos anjos?... Será possível ultrapassar a grandeza e a beleza de visão de uma Virgem que possui, amamenta, aquece em Seus braços a Luz e o Salvador do mundo?

Impossível aos homens, impossível aos anjos, porém não o é para Deus. Querendo torná-lA ainda mais bela, dotando-A com toda a plenitude de beleza, Ele a fará subir um novo degrau da escada do infinito.

E, de fato, mesmo aqui neste mundo, a grandeza, a elevação, o poder, os encantos da alma, do coração e do espírito não são a última palavra de beleza... fica-lhe ainda a dor.

Escreveu a respeito um eminente poeta:

"Dir-se-ia que a vida não faz senão tocar de leve a superfície da alma daqueles que não sofrem, disse Mons. Bougaud (O cristianismo e os tempos presentes), seus sentimentos são sem intensidade, o seu coração não tem ternuras, o seu espírito não possui um horizonte! Sobre a dor são graduadas a beleza e a grandeza das almas".

E esta auréola vem juntar-se às demais auréolas que iluminam a fronte virginal de Maria.

Mas, meu Deus, será possível?... Fazer sofrer esta criatura amante, pura, ornada de todas as graças e de todas as ternuras de Vosso coração?... Magoar esta alma cândida de que sois a única aspiração, calçar este coração amante que não suspira senão por Vós?

Oh! quem, entre os homens, teria a barbaridade de fazer sofrer esta Virgem?... Quem?...
Entretanto, é preciso, porque a dor é o píncaro da beleza moral!...

E no alto dos céus, os anjos, mais e mais maravilhados, entoam ainda o seu "Quae est ista? - Quem será esta jovem aflita, absorvida, mergulhada num abismo de dores, às quais não se assemelha nenhuma outra dor?

Sim, a Virgem "cheia de graça" é também "cheia de dores" subiu ao Calvário, e aí, de pé, sob a alude esmagadora de Seu Filho, que todos abandonaram, e com Ele em espírito sobre o patíbulo da Cruz, Ela ajunta à plenitude de Sua beleza a plenitude do heroísmo.

Ela se torna então a Mãe da dor, a Mãe aflita, a Rainha dos mártires!...

E os anjos, em sua admiração, recomeçam, jubilosos: "Quae est ista?... Quem é esta mulher forte, feita de amor, de beleza e de heroísmo?...

"Ela é terrível como um exército em ordem de batalha" (Cant. 6,9).
Tudo isto é sublime, inenarrável, divino!

Até aqui, diz Mons. Bolo, a Virgem, vítima, teve ainda o Seu Jesus junto a Si, para fortificá-lA e encorajá-lA pelo exemplo e pela palavra.

O Seu coração se inflamava ao contato de Seu Filho e Seu Deus.
Sua alma se dilatava, desejosa de sofrimento e de martírio, ao contato da alma do Salvador.

Deus, porém, vai pedir-Lhe um sacrifício supremo: - o de sobreviver ao Seu Jesus, durante mais de vinte anos, sozinha, desamparada, sem o apoio d'Aquele que era tudo para Ela. Que sacrifício!...

E a pobre Mãe dolente viu estenderem-se ainda as trevas de Seu longo luto, após a luz tão resplandecente da Sua união a Jesus. A santa e virginal Mártir ficará na terra meditando sem cessar os sofrimentos de Seu amado Filho, visitando lacrimosa os lugares das torturas, beijando e cobrindo de ternura tudo o que Jesus tocara e santificara na terra.

Ela ficará assim durante mais de vinte anos, carregando o horrível fardo da lembrança dos sofrimentos de Jesus.

Que martírio! se sob um tão grande peso - o peso esmagador de tantas lembranças, Sua energia, longe de desfalecer, cresce ainda mais, se o Seu coração amante, em vez de se esgotar, se torna mais largo e mais profundo em Seu amor, durante esta longa ausência do Bem-Amado, não será isso uma nova plenitude, acrescentada às demais?...

Eis por que Maria espera na terra, continuando o Seu misterioso crescimento. E isto, até à hora em que a graça, pela sua abundância, rompe o vaso abalastrino de Sua carne, que já não podia conter tanto perfume, em que Ela voa em corpo e alma para a morada da plenitude absoluta da graça, por não poder a terra ficar em posse de um tesouro demais ideal, de que só o céu é digno.

E os anjos exultam, emociona-se o paraíso, vão eles, enfim, possuir em Jesus e Maria o ideal da beleza criada. A multidão celeste vai ter Sua Rainha e vai fazer-Lhe as honras do triunfo, de cuja demora já estão impacientes.

E embora saibam desde muito tempo o Seu nome, eles cantam: "Quae est ista? - Quem é esta que sobe do deserto deste mundo como uma leve coluna de fumo, composta de aroma de mirra, de incenso e de toda espécie de aromas?"... (Cant. 3,6).

O triunfo é completo. A beleza da Virgem está concluída e atingiu a Sua plenitude. Ela reina lá nos Céus à direita de seu Filho, radiante de todas as graças, com a fronte cingida de todas as glórias, resplandescendo de todas as belezas.

E Ela se nos mostra a nós, que somos Seus filhos, para ser amada!...
E quem não A amaria?... Corremos ao encalço da beleza para dar-lhe o nosso coração, e atingindo o nosso ideal, inebriamo-nos ao Seu aspecto!...

Elevemos os olhos, fitemos Maria, bela com todos os encantos! Ela deslumbrou o coração de Deus, dos anjos, dos santos e não deslumbraria o nosso coração?... Ó Maria! "Specie tua et pulchritudine tua, prospere procede et regna", por Vossa beleza e Vossas graças, apoderai-Vos dos nossos corações e reinai sobre nós!

Por que amo Maria, pelo Pe. Júlio Maria

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