terça-feira, 20 de agosto de 2019

A alma culpada diante do Juiz Divino

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Omnes nos manifestari oportet ante tribunal Christi – “Todos nós devemos manifestar-nos diante do tribunal de Cristo” (2 Cor 5, 10)
Sumário. Têm-se visto criminosos banhados em suor frio, na presença de um juiz terrestre. Que maior terror não deve sentir o pecador diante do tribunal de Jesus Cristo? Ó céus! Verá acima de si o Juiz irritado, por baixo o inferno aberto, a um lado os pecados que o acusam, ao outro os demônios armados para o seu suplício. O Bem-aventurado Juvenal Ancina, impressionado por esta grande verdade, resolveu deixar o mundo e fez-se religioso. Meu irmão, o que farás? Continuarás a viver em teu estado de tibieza?

I. É sentimento comum entre os teólogos, que o juízo particular se faz logo que o homem expira, e que no próprio lugar onde a alma se separa do corpo, aí é julgada por Jesus Cristo, que não manda alguém em seu lugar, mas vem ele mesmo para a julgar. Qual não será o espanto daquele que, vendo pela primeira vez seu Redentor, o vir indignado!
Ante faciem indignationis eius quis stabit? (1) – “Diante da face de sua indignação quem é que poderá subsistir?” Este pensamento causava tal estremecimento ao Padre Luiz Dupont, que fazia tremer consigo a cela onde se achava. O Bem-aventurado Juvenal Ancina, ouvindo cantar o Dies irae, e pensando no terror que se há de apoderar da alma ao comparecer em juízo, resolveu deixar o mundo, o que efetivamente fez. – O aspecto do Juiz indignado será o anúncio da condenação: Indignatio regis, nuntii mortis (2). Segundo São Bernardo, será maior sofrimento para a alma ver Jesus Cristo indignado do que estar no inferno.
Têm-se visto criminosos banhados em suor frio na presença de um juiz terrestre. Pison, comparecendo no senado em traje de réu, sentiu tamanha confusão, que a si próprio se deu a morte. Que pena não é para um filho ou para um vassalo ver seu pai ou seu príncipe indignado! Que maior mágoa não deve sentir a alma à vista de Jesus Cristo, a quem desprezou durante toda a vida! Videbunt in quem transfixerunt (3) – “Verão aquele a quem traspassaram”. Esse Cordeiro, tão paciente durante a vida do pecador, então mostrar-se-lhe-á irritado, sem esperança de se deixar aplacar. Pelo que a alma pedirá às montanhas que a esmaguem e a furtem às iras do Cordeiro indignado: Montes, cadite super nos, abscondite nos ab ira Agni (4).
II. Opinam os Doutores que o divino Juiz virá julgar a alma em forma humana, e portanto com as mesmas chagas com que deixou a terra. Estas chagas serão motivo de consolação para os justos, mas que terror e espanto não inspirarão ao pecador! A vista do Homem-Deus, que, morreu para o salvar, far-lhe-á sentir mais vivamente a sua ingratidão.
Quando José do Egito disse a seus irmãos: Eu sou José, a quem vendestes, diz a Escritura, que pelo terror perderam a fala e ficaram calados (5). Que responderá, pois, o pecador a Jesus Cristo? Terá coragem de lhe pedir misericórdia, quando, primeiro que tudo, tem de lhe dar contas do abuso que fez da misericórdia? Que fará então? Pergunta Santo Agostinho, para onde fugirá o miserável, quando vir acima de si o Juiz irritado, por baixo o inferno aberto, a um lado os pecados que o acusam, a outro os demônios armados para execução do suplício e dentro de si os remorsos de sua consciência?
Ó meu Jesus, quero chamar-Vos sempre Jesus; vosso nome me consola e me anima, recordando-me que sois o Salvador que morreu para me salvar. Aqui me tendes a vossos pés; confesso que mereci o inferno tantas vezes quantas Vos ofendi pelo pecado mortal. Sou indigno de perdão, mas Vós morrestes para me perdoar. Ah, meu Jesus, perdoai-me antes de virdes a julgar-me. Então não poderei implorar a vossa misericórdia; mas agora posso pedi-la e espero-a. Então vossas chagas me inspirarão terror, agora insipiram-me confiança. Meu querido Redentor, acima de todos os males, arrependo-me de ter ofendido a vossa bondade infinita. Estou resolvido, antes, a aceitar todas as penas, todos os sacrifícios, do que vir a perder a vossa graça. Amo-Vos de todo o coração. Tende piedade de mim, segundo a vossa grande misericórdia: Miserere mei secundum magnam misericordiam tuam (6).
– Ó Maria, Mãe de misericórdia, Advogada dos pecadores, obtentede-me uma grande dor dos meus pecados, o perdão e a perseverança no amor divino. Amo-vos, ó minha Rainha, e em vós ponho minha confiança.
Referências:
(1) Na 1, 6
(2) Pv 16, 14
(3) Jo 19, 37
(4) Ap 6, 16
(5) Gn 45, 4
(6) Sl 50, 1
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 309-311)


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